segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Uma História de verdade


Nelson levava a vida que, verdadeiramente, muita gente queria levar para o resto da vida. O problema era a vida de Nelson levava para levar essa vida. Nelson era o mais mentiroso dos mentirosos, incluindo os políticos brasileiros. Nelson ganharia uma eleição fácil desses amadores na arte de vestir a verdade.

Inclusive, Nelson, que é publicitário praticante, realizou diversas campanhas - desviando verba pública - para eleger certos errados representantes do povo. E teve êxito em todas. De cara limpa nesse jogo sujo, Nelson ficou podre de rico. Afinal, ele não tinha partido nem posição política. Um verdadeiro democrático.

Rico e com o dom que nascera com ele, Nelson pegava a mulher que queria. E quando a moça queria pegá-lo para algo a mais além de um carrão, uma semana em Paris ou anel de brilhantes, Nelson dava um jeito de sumir sem fazer o amor da donzela desaparecer. Era um mágico.

Nelson tinha cinco ilhas particulares, quinze mansões, vinte e cinco carros de luxo, trinta e cinco bilhões em contas na Suíça e uma pedra de ouro, que foi deixada por sua mãe, que morreu vinte e cinco anos atrás, e estava avaliada em cinco mil reais. A pedra de ouro, não a mãe. Apesar de Nelson ter sido chamado de filho da puta muitas vezes.

Não dava para negar, apesar de fazer coisas ruins, Nelson era muito bom no que fazia. Mas um dia tudo mudou. Nelson conheceu uma menina e de todos seus pecados, ele se arrependeu... Não, espera, essa é outra história. Nelson, teve um sonho no qual sua falecida mãe lhe pediu para que ele parasse de mentir.

A primeira mentira contada por Nelson matou sua progenitora. Nelson, para ir embora mais cedo da escola, falou que sua mãezinha estava doente, à beira da morte, e ele precisava visitá-la. Nelson tinha cinco anos. Semanas depois, a velha morreu de desgosto ao descobrir a atitude do jovem 171. No já citado sonho, a santa mãezinha (depois que morre, todo mundo é bom) pediu para que Nelson, em seu aniversário de 30 anos, parasse de enganar as pessoas. Nelson aceitou, pois, por essa morte, se sentia o culpado. Nelson era feliz mas era triste. Nelson mentia porque a realidade não lhe agradava. Preferia viver um mundo erguido em tijolos de luz.

Um mês antes de fazer trinta anos, Nelson devolveu quase todas as suas posses. Ficou apenas com a pedra de ouro, que não havia sido adquirida de forma ilegal. Vendeu a sua pequena herança e foi morar de favor na casa do primo Haroldo, para quem narrou o sonho. Haroldo era tão honesto que dava raiva. Por isso vivia sozinho. Ninguém aguentava tanta verdade.

Uma vez, Haroldo se envolveu com uma mulher casada. Quando ficou sabendo que a dama estava passando seu rei para trás, a personificação da honestidade foi contar ao corno o que estava pegando. Ou melhor, quem ele estava pegando. Resultado: Haroldo tomou três tiros no coração. Reza a lenda que ele morreu, mas que São Pedro o mandou voltar para a terra, temendo a sacra concorrência.

Saindo do céu para o inferno, Nelson arrumou um trabalho como redator. Passou a levar uma vida sem luxos. Normal. Burocrática. Feijão com arroz. Acordava cedo, pegava um ônibus lotado, trânsito para ir e voltar do trabalho, chegava em casa, via a novela e pegava no sono. Nada de sexo com mulheres fantásticas ou festas intermináveis. Tampouco viagens e companhias requintadas. O dia acabava na pausa de Walcyr Carrasco. Assim se foi um mês.

No esperado aniversário de Nelson, o primo Haroldo, antes mesmo de desejar os parabéns ao parente, perguntou:

- E aí, Nelson, vai parar de mentir?

Nelson coçou a cabeça dezessete vezes e respondeu:

- Nunca mais eu minto! Essa é a última vez.

Um comentário:

Paula S disse...

Hahahahaha. Muito boa, cara! Seus textos de humor são sempre excelentes.