Mudança permanente

Uma das lembranças mais fortes que tenho da minha infância é a imagem da minha mãe mudando os móveis da casa de local. Colocando a estante no lugar do sofá, as almofadas no chão, a mesa de centro no canto da sala etc. Não é à toa que se chamam “móveis”. Desculpem pelo trocadilho.

O relógio de madeira antigo - presente que meus pais ganharam de casamento - apontou que o tempo passou. No entanto, minha mãe seguia com o mesmo hábito de desabitar os móveis de seus locais anteriores. Pelo menos uma vez por mês essa remoção acontecia. E ainda acontece, como se fosse uma obra eterna do governo do Rio de Janeiro.

Um dia, cheguei em casa e ela estava deslocando os móveis do meu quarto. Pedi para que parasse. Gosto da decoração do meu santuário de coçação de saco, embora ele esteja cada vez mais próximo de um escritório de trabalho.

Ela então, contrariada, disse que eu não gostava de mudança, que era metódico e que na vida é necessário experimentar coisas novas. Sentir a novidade. Em tom de brincadeira (arriscada), eu disse que ela era casada com o mesmo homem e vivia na mesma casa há quase 30 anos, que quem não curtia coisa nova era ela. Velha de costumes antigos.

Enquanto eu esperava uma resposta violenta, me veio uma sábia e leve lição. Mamãe disse: “Por que você acha que mudo tanto os móveis da casa de lugar? Até quem vive em uma rotina feliz como a minha, precisa de uma variada de vez em quando. Permanente, só as escovas e as mudanças, meu filho. Falando nisso, aonde foi parar aquele pente vermelho? Desde a mudança do meu quarto no mês retrasado que não o vejo”.