sábado, 22 de outubro de 2016

Vítima

Quase foi jogador profissional de vôlei, mas não conseguiu porque, segundo ele, nesse esporte só se dá bem quem tem QI - quem indica. Embora tivesse um metro e meio de altura, pensava assim. Grande QI.

Mais velho, quase foi professor de educação física, mas não conseguiu porque, segundo ele, nessa área tem muita burocracia. Porém, nem terminou o ensino médio. Grande QI.

Tempos depois, quase foi dono de restaurante, mas não conseguiu porque, segundo ele, nessa área tem muita panela (literal e não literalmente) e as pessoas não recebem bem gente nova. Já tinha até dinheiro guardado para começar. Juntou R$ 300 e achava o suficiente para abrir um estabelecimento de alto nível.

Na mesma época, quase foi o melhor vendedor da loja roupas onde trabalhou por anos. Tirando os outros 11 vendedores, ele foi o segundo e, segundo ele, era injustiçado pelos clientes que não compravam com ele. Mesmo nos horários que ele não estava na loja.

Quase se casou. Só não subiu ao altar porque, segundo ele, a ex-namorada exagerou ao largá-lo depois da segunda traição. “Ingrata e injusta”, diz ele se referindo a ela.

Os amigos se afastaram e, segundo ele, foram babacas. “Pararam de andar comigo só porque não aceito opiniões contrárias, olhava bastante para as esposas deles e arrumava umas brigas com eles, às vezes, só às vezes”, conta a injustiça.

Um dia de domingo, ele se olhou no espelho e decidiu que tudo ia mudar. Não. Não, ele não percebeu que, às vezes, as coisas dão errado por nossa culpa, ele decidiu que, segunda-feira, iria pintar o cabelo. Pela segunda vez na vida.

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