sábado, 28 de dezembro de 2013

Amanhã não passa de hoje

Chatices à parte, sempre tiro algo de bom dessas reuniões familiares de final de ano. “Até fruta estragada faz suco”, já dizia eu mesmo. Enquanto comia um pavê e ouvia piadas do meu tio (é pavê ou pra comer?), conversava com minha avó e uma prima, que cresceu uns dez anos desde o último natal. “Deus fez as primas para não pegarmos as irmãs”, falou outro tio, bêbado.

A moça, no auge de seus 20 verões, disse que sempre chora nas viradas de ano. Revelou que não precisa estar bêbada, drogada, triste ou sentindo falta de alguém. Simplesmente chora. Molha a praia de Copacabana com suas lágrimas de virgem (sic).

Ao ver minha prima fazer tal relato, me lembrei de ter visto muita gente apagando fogos de artificio com prantos ao longo do meu quase meio meio século de vida. Primeiro as tias, tios mãe, vizinhas e vizinhos, na época em que eu ainda não podia curtir farras longe do lar doce lar na sempre linda e perigosa Cidade Maravilhosa. Sempre achei que essas lágrimas caiam empurradas pela fata de um parente, vivo ou morto - nesse caso, realmente é melhor não aparecer. Tempos depois, com os amigos, achava que eram as drogas mesmo.

Essa choradeira sempre vem um pouco depois daquele momento no qual as pessoas falam suas metas para o ano que está chegando. Uns querem um novo emprego, outros querem um emprego. Uns querem entrar na faculdade, outros garantem que vão sair dela. Uns querem amor, outros, ainda que neguem, também.

Com a sabedoria que só o peso de muitos calendários dá, minha vó indagou que isso é medo novo. Do futuro. Que muita gente sente esse golpe porque não sabe o que fazer diante de uma data que nos força a mudar. De acordo com a velha, é por isso que fazemos planos, para tentar controlar essa possível enxurrada de novidades. Os clichês ficam em dezembro. Janeiro é um rio de incertezas, e incertezas assustam quem é doutrinado a ter uma “vida no lugar”.

Já com a donzela no colo, vovó deu uma dica: “não chore na virada desse ano. Lembra quando você era criança e dizia que tinha um bicho papão no seu quarto, mas que ele só aparecia durante a noite? Eu te falei que a única diferença entre o dia e a noite era a luz apagada. Pois bem, a única diferença entre o dia 31 e dezembro e o primeiro de janeiro é a luz acesa do sol, ou dos fogos. Não tenha medo do amanhã. Não tema o que não existe. O amanhã quando chega já é hoje. E hoje está tudo bem”.

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